sexta-feira, 2 de março de 2012

O ATREVIDO VOTO DE JEFTÉ

Há alguns dias atrás, ouvi de alguém que o voto de Jefté foi cumprido à risca, tendo sua filha permanecido solteira por toda a sua vida. Mas, terá sido esse o voto de Jefté?  

O interessante é que um programa de TV que discute assuntos polêmicos de cunho religioso ou social, tratou desse mesmo assunto há alguns meses e houve quem interpretasse o texto dessa mesma forma, baseando seu argumento no fato de que o Senhor nunca pediu o sacrifício de alguém como holocausto. É como negar a presença dos anjos rebeldes de que fala Judas em sua Epístola, que pecaram entregando-se à imoralidade, sensualidade e dissolução, argumentando, para tanto, que no Céu seremos iguais aos anjos que não se casam nem se dão em casamento.

Um determinado site de características judaicas afirma que Javé nunca aceitaria o sacrifício de um ser humano, porque já havia determinado em Lev. 18.21 "...E da tua semente não darás ninguém para ser dedicado a Moloque..." e em 20.2: "Qualquer dos filhos de Israel... que der de seus filhos a Moloque, será morto; o povo o apedrejará.

Sem qualquer regra hermenêuica ou memo exegética, tenta-se comparar o Senhor Deus a Moloque, uma entidade cananéia que, segundo eles, era senhor da vida e da morte e cuidava da agricultura e da fertilidade no campo e nos casamentos.

Todavia, qual foi o voto de Jefté e porque ele o cumpriu à risca? Primeiramente, é bom lembrar que em Lev. 27.29, o Senhor determina: “Todo ser humano que for devotado como anátema[1] ao Senhor não poderá ser resgatado. Certamente morrerá”.

O voto de Jefté foi nos seguintes termos: “... Se, com efeito, me entregares os filhos de Amom na minha mão, aquele que sair pela porta da minha casa ao meu encontro, ao retornar vitorioso dos filhos de Amom, será do Senhor, e eu o oferecerei em holocausto”.

Jefté não imaginava que sua filha, única filha, sairia pela porta da sua casa, dançando radiante e com instrumento de som, louvando ao Senhor pela certeza da vitória do seu povo liderado pelo seu pai. Ele se sentiu perturbado diante da seriedade com que os votos eram tratados, uma vez pronunciados. Não havia outra saída, senão cumprir o voto declarado solenemente, e Jefté sabia disso – “vehayah layhovah veha‘alithihu ‘olah” (e será para o Senhor, e [eu] o oferecerei (farei subir)[2] em holocausto.

Sua filha pediu dois meses para chorar a sua virgindade e ele o concedeu. Ao fim dos dois meses, ele fez segundo o voto que proferira temerariamente. E ela foi imolada.

Um dos midraxes do povo do norte, descendente da família gileadita, descreve uma coreografia interessante, já que a morte desta jovem foi inevitável – daí o midraxe, no qual lamenta-se sua morte e sua dedicação ao Senhor, e por ter morrido virgem.
Os cristãos da Igreja grega Ortodoxa têm uma tradição em que Maria, ao ser entregue pelos que a traziam do templo de Jerusalém para José, o detentor da herança bacuriana  - primogenital davídica – sendo ele o único que fazia jus em resgatá-la, permaneceu ela por este tempo virgem, antes de ser possuída por José. E foi durante esse tempo que ela se achou grávida pelo Espírito Santo. Oh, Glória!


[1] O termo empregado no texto hebraico é hierem (lê-se rérem), da mesma raiz de hiormah (anátema).
[2] Trata-se do verbo ‘alah, no causativo, isto é, ‘fazer subir’. O emprego do verbo é metonímico, ou seja, toma a parte pelo todo: o sacrifício é enviado para o céu, daí ‘olah (holocausto).

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